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domingo, 19 de fevereiro de 2012

ESPECIAL DE CARNAVAL

19.02.12
Paulo César de Abreu Carrazzoni
Siden Francesch do Amaral

As Escolas de Samba do Grupo Especial de Porto Alegre realizaram um Carnaval exuberante. Os desfiles ocorreram nas noites de sexta-feira e sábado, atravessando a madrugada, terminando aproximadamente, às 6 h do dia seguinte.

SENADOR PAIM HOMENAGEADO
A Imperadores do Samba realizou um desfile maravilhoso homenageando o senador Paulo Paim.

A alegoria do abre-alas apresentava o político que saiu de Caxias do Sul para ficar conhecido em todo o Brasil.

A ala das baianas, nas cores da bandeira brasileira, fazia alusão aos votos que conduziram Paim até Brasília.

Na última alegoria o senador desfilou acenando ao público.

Com seu desfile sensacional, visto por muitos como impecável (com o que nós concordamos), a Imperadores é séria candidata ao título, tendo nesse sentido, na nossa modesta opinião, como rivais a Escola da Restinga e a Império da Zona Norte.

Vale salientar, que a decisão dos jurados pode surpreender. A pontuação em algum quesito pode ser decisiva. É aguardar até terça para saber.

SOLIDARIEDADE NO CARNAVAL
É digna de aplausos a atitude de vários presidentes das Escolas de Samba, que saíram imediatamente, em socorro, quando um carro, por acidente de percurso,  da Protegidos da Princesa Isabel, (Novo Hamburgo) teve dificuldades na evolução na pista do desfile.

A Campeã do Carnaval, assim como a escola rebaixada, quem decidirá são as notas dos jurados atribuídas nos diversos quesitos. Desejamos Boa Sorte a todas, em especial a Protegidos, a Escola de Samba que representa Novo Hamburgo,  no Grupo Especial de Porto Alegre.  Escola pela qual inúmeras vezes desfilamos.

Parabéns a todas as  Escolas que desfilaram e fizeram um belo Carnaval!
Por Siden F. Amaral, Professor Estadual.

“Biciclotecário”, o homem que montou uma biblioteca sobre rodas
Conheça a história do ex-agropecuarista Robson Mendonça, que já emprestou mais de 4 mil livros a moradores de rua do Centro de São Paulo. "Carrego até 200 quilos de livros"

Eu era agropecuarista em Alegrete (RS) e há dez anos decidi vender tudo e vir para São Paulo. Logo que cheguei, fui assaltado. Sem dinheiro ou documentos, virei morador de rua. Minha mulher e filhos vieram pouco depois, mas morreram num acidente de carro. Por causa da emergência, pedi para dar um telefonema num prédio público e fui proibido de entrar. Fiquei revoltado, juntei um pessoal de albergues e formamos um grupo para lutar pelos nossos direitos. Surgiu o Movimento Estadual da População em Situação de Rua, que ajuda a encaminhar os sem-teto a cursos e empregos. Só em 2011 tiramos 242 pessoas da rua.

Descobri que não conseguiria nada sem estudo. Tentava pegar livros em bibliotecas, mas não podia, porque não tinha comprovante de residência. Decidi que um dia criaria uma biblioteca itinerante que não exigisse nenhum cadastro. Quando conheci o Lincoln Paiva, presidente do Instituto Mobilidade Verde, enviei o projeto e eles viabilizaram a “bicicloteca”. Levo até 200 quilos de livros pelo Centro todos os dias, quase 300 obras! Temos cerca de 18 mil livros para ser emprestados e 90% dos leitores são moradores de rua.

Há dois meses a bicicloteca foi roubada durante uma reportagem. Descobri quem a levou e a polícia foi comigo buscar o triciclo, que precisou ser reformado. Vamos conseguir mais dez biciclotecas até o fim de 2012. Já conseguimos até um modelo elétrico que disponibiliza Wi-Fi e uma webcam, para cadastrar fotos dos moradores e ajudar as famílias a encontrá-los.

Hoje moro em uma pensão e leio bastante. Meu autor preferido é Mario de Andrade e o livro que mais marcou minha vida foi A revolução dos bichos, de George Orwell. Tenho lido muitos textos na área de Direito para aprender sobre jurisprudência e entender os casos da população de rua. Não acreditam que eu faço isso de graça. Um dia um rapaz da Praça da Sé disse que antes da bicicloteca ele e os colegas viviam bebendo cachaça e agora estão estudando. Quer pagamento maior que ver alguém aprender?
Fonte:  Epoca São Paulo
Por Sergio Weber, Professor e Diretor no 14 Núcleo.

EDUCAÇÃO POPULAR COMO ESTRATÉGIA POLÍTICA
Roberto Leher - 19.02.12
O artigo discute a trajetória recente da educação popular na universidade e nos movimentos sociais, compreendendo-a em uma perspectiva que trabalha as contradições entre “educação, capitalismo e classes sociais”. A idéia central sustentada no texto é que, pensada enquanto hegemonia, a educação é parte da estratégia política e, por isso, historicamente, os setores dominantes têm empreendido esforços para caracterizá-la, e aprisioná-la, como um campo guiado por razão utilitarista e, não menos importante, como atividade a ser confiada aos especialistas por seu conteúdo supostamente técnico-científico. Em contraste, quando movimentos sociais, partidos socialistas, comunidades eclesiais de base – que comungavam os valores da teologia da libertação –, entre outras formas de organização das lutas sociais, pretenderam conferir prioridade à educação popular, os setores dominantes combateram vigorosamente esse intento. A repressão da ditadura empresarial-militar às iniciativas de educação popular que resultaram na cassação de Paulo Freire e na desarticulação do Movimento de Educação de Base, entre outros, são ilustrativos desse processo (Fávero, 2006). 

Quando as lutas sociais foram retomadas com maior vigor, no final da década de 1970, gradativamente as práticas de educação popular e as reflexões sobre esta perspectiva de educação foram sendo resgatadas, inclusive estabelecendo diálogo com a educação pública. Entretanto, o ascenso das lutas populares, na década de 1980, foi compreendido pelos setores dominantes como uma ameaça à governabilidade. O melhor antídoto para o ascenso popular era o pacote de ajuste estrutural preconizado pelo FMI e pelo Banco Mundial. Para viabilizá-lo no Brasil esses setores tiveram de se valer de um político arrivista para garantir a presidência da República, que apesar de ter aderido ao credo neoliberal com ardor, não foi capaz de implementá-lo com a força política necessária. A agenda do ajuste foi consolidada no governo Cardoso, em meados da década de 1990.

O estrangulamento financeiro empurrou grande parte do sindicalismo docente para as lutas econômico-corporativas
Essa ofensiva neoconservadora também ocorreu na educação. Diferente do período ditatorial, a repressão aos educadores não poderia ser direta ou, pelo menos, não poderia ser realizada por meio de cassações ou de prisões. O combate foi feito de múltiplas formas.O estrangulamento financeiro empurrou grande parte do sindicalismo docente para as lutas econômico-corporativas. Os convênios e assessorias do Banco Mundial deslocaram o problema educacional para o terreno da gestão empresarial, denominada, então, de qualidade total (atualmente é designada Programa de Gestão Escolar). Também a universidade e o aparato de ciência e tecnologia incidiram sobre o que é dado a pensar na educação. De fato, ao longo dos anos 1990, o establishment acadêmico, incluindo agências de fomento e fundações internacionais, empreendeu uma política sistemática de marginalização da temática “educação, capitalismo e classes sociais” que, assim, conheceu um aparente ostracismo.

A retomada das discussões sobre a educação popular foi colocada em pauta pelos movimentos sociais. As contradições ensejadas pelas políticas de “ajuste estrutural” neoliberal provocaram relativa ascensão das lutas sociais, assim como recolocaram na agenda dos movimentos sociais a necessidade de repensar suas estratégias. Nesse contexto é possível verificar um extraordinário revigoramento da educação popular e, em particular, da formação política. Examinando a experiência latino-americana, em especial a luta dos povos originários (Zapatistas/ México, Conaie/Equador e Coccaleros/Bolívia) e movimentos camponeses (MST- Brasil), é possível postular que o movimento de renovação da educação popular está indissoluvelmente relacionado com a necessidade de uma nova episteme que supere as perspectivas eurocêntricas. Com base nessas considerações, este artigo defende que a educação popular está no âmago da estratégia de luta pelo socialismo – como acentuou Gramsci a propósito da cultura e da formação política –, e, por isso, a sua força ou fraqueza tem uma relação direta com a correlação de forças e com o estado da auto-organização das forças populares.

A ofensiva neoconservadora contra a educação popular
A redução do sentido do que é público, por meio da defesa de ações de uma sociedade civil sem capitalismo e sem classes sociais, e a desarticulação entre educação, capitalismo e classe social, concorreram fortemente para a relativa perda de relevância da temática da educação da classe trabalhadora no âmbito acadêmico. A tecnicização e a psicologização da área concorreram para o silenciamento do pensamento pedagógico produzido no processo de descolonização e, mais amplamente, do pensamento educacional socialista e, com isso, das obras de Aimé Cesare, Amílcar Cabral, Anatoliy Vasilievich Lunacharsky, Antônio Gramsci, Augusto César Sandino, José Carlos Mariátegui, José Martí, Julio Antonio Mella, Lev Semionovitch Vygotsky, Moisei Mikhailovich Pistrak, Nadezhda Konstantinovna Krupskaya, Paulo Freire, Roberto Fernández Retamar, entre outros. Os autores ainda lidos hoje, como Vygostsky e Freire, o foram, geralmente, em uma perspectiva estritamente pedagógica, desvinculada da política e das lutas anticapitalistas, quase que separada da sociedade de classes.

Como a educação está imersa nas contradições da sociedade de classe, a sociedade realmente existente, a difusão de que a educação é neutra não se coaduna com o real. O entrelaçamento da educação com as lutas de classes não é apenas uma “triste imperfeição” da história, pois a luta de classes é um instrumento, até o presente, necessário para o desenvolvimento social. A predominância das concepções tecnicista, romântica e pós-moderna expressa, por conseguinte, a força relativa das classes dominantes que têm logrado impor o seu modo de pensar a educação.

Ao investigar retrospectivamente as três últimas décadas, é possível identificar engrenagens que fizeram mover o mais perverso e terrível círculo vicioso: a adversidade das lutas cotidianas em um contexto de derrotas e perdas, as debilidades educacionais da juventude das periferias e do campo, o efeito devastador das ideologias dominantes e as derrotas na concepção socialista dos próprios movimentos, partidos e sindicatos, são situações que, em resumo, enfraqueceram as próprias condições para a autoformação da classe. E na ausência de condições subjetivas e objetivas de “formação” da classe não há como avançar nas estratégias e na disputa hegemônica e, por conseguinte, na elaboração da educação popular como parte da estratégia da luta de classes.

Nas universidades, a situação não pôde ser melhor. As agências internacionais e nacionais de financiamento da C&T não apoiaram essa linha de investigação, o que enfraqueceu sua presença na pós-graduação, e incentivou perspectivas neopositivistas, pós-modernas e toda uma adocicada perspectiva pedagógica psicologizada baseada em uma infância e juventude pura e feliz: pressupostos longe de serem verdadeiros para a amplíssima maioria dos jovens brasileiros que habitam as periferias e o campo do país.

Se nos Trinta Gloriosos Anos do Capitalismo os filhos dos trabalhadores foram educados tão-somente para as máquinas, o atual padrão de acumulação é ainda pior. A educação dirigida às massas não pode almejar senão a formação de trabalhadores precarizados e “sobrantes” que viverão não apenas fora do mercado de trabalho regulado, como dependerão de políticas de alívio à pobreza para não sucumbirem à fome e à miséria absoluta. Em outros termos, o atual nível mínimo de conhecimento indispensável para as classes populares é ainda mais rebaixado do que em períodos pretéritos.

Pobreza e despossuimento da educação, da ciência e da cultura são dimensões próprias da sociedade de classes que, ademais, contribuem para a manutenção da ordem social. Vale lembrar que no sistema de castas indiano, a antiga lei de Manu afirmava que a instrução e a ciência eram direito de propriedade dos dominantes: “quem se apropriar do conhecimento do Veda sem permissão será culpado de roubo” (Adler, 1980). O mesmo aconteceu com todo o sistema colonial e neocolonial que, em geral, proibiu o uso do idioma nativo nas escolas e impediu a criação de universidades. No capitalismo tardio tudo isso é mais velado e sutil, mas as consequências não são tão diferentes para a maioria das pessoas.

A mudança nesse panorama não é, evidentemente, um problema estritamente pedagógico. Os termos do debate somente puderam ser modificados com a alteração da correlação de forças sociais. Diante dos desafios das lutas antineoliberais, os movimentos localizaram a formação política (a educação como hegemonia) no andar superior da agenda política, restabelecendo gradativamente, com avanços e recuos, os nexos entre educação, capitalismo e classe.

As contradições do padrão de acumulação reacendem a luta pela educação popular
Com efeito, o relativo ascenso das lutas sociais em toda a América Latina, identificado pelo Observatório Social da América Latina (OSAL/CLACSO), e que pode ser constatado pelos dramáticos acontecimentos na Argentina, na Bolívia e no Equador, países que tiveram presidentes destituídos pela força das lutas populares, recolocou a questão da educação popular na agenda educacional e dos movimentos sociais. Como observou Zibechi (2003), uma das características dos principais movimentos anti-sistêmicos é a preocupação com a auto formação de seus quadros dirigentes e de seus militantes. Essa necessidade tem a ver com o fato de que o problema ideológico atual é, em certo sentido, ainda mais complexo do que o da ideologia do desenvolvimento que estruturava o controle social no contexto da chamada Guerra Fria. De fato, a promessa de desenvolvimento “dentro da ordem” podia ser amparada pelo expressivo crescimento econômico e pela crescente formalização do trabalho. Caso a contestação ultrapassasse os marcos da ordem, a doutrina da segurança e as ditaduras encarregar-se-iam de mostrar a materialidade dos meios de dominação.

Diferentemente, a força da ideologia neoliberal não é fácil de ser compreendida. Apesar do rastro de destruição que tem provocado em todo o planeta, o neoliberalismo e o seu correspondente “o pensamento único” (TINA: There is no alternative/Não há alternativa, a que se referira Thatcher), é tão penetrante que mesmo partidos, sindicatos e movimentos que originalmente a ela se opunham, até mesmo o partido comunista chinês, pouco a pouco foram sendo “conformados” à ideia de que realmente não existe alternativa às políticas econômicas neoliberais e à integração capitalista dependente do país na economia-mundo.

Tal como a ideologia do progresso criticada por Walter Benjamin, essa ideologia impede o olhar para o passado. A crise estrutural do capitalismo hodierna (Dúmenil & Lévy, 1996) é mostrada para nós como uma série de acontecimentos virtuosos que culminará com a “globalização” redentora. Entretanto, ainda conforme Walter Benjamin, o Anjo da História, representado pelo Angelus Novus de Klee, ao olhar para o passado, vê a catástrofe do “progresso”:

Seu rosto está dirigido para o passado. Onde nós vemos uma cadeia de acontecimentos, ele vê uma catástrofe única, que acumula incansavelmente ruína sobre ruína e as dispersa a nossos pés. Ele gostaria de deter-se para acordar os mortos e juntar os fragmentos. Mas uma tempestade sopra do paraíso e prende-se em suas asas com tanta força que ele não pode mais fechá-las. Essa tempestade o impele irresistivelmente para o futuro, ao qual ele vira as costas, enquanto o amontoado de ruínas cresce até o céu. Essa tempestade é o que chamamos progresso. (BENJAMIN, 1994:226)

Esse conformismo tem graves consequências. Se não há como se opor à ideologia neoliberal e à inserção na economia-mundo, nos termos definidos por Florestan Fernandes como capitalismo dependente, então não há como se insurgir contra as frações locais da burguesia que empolgam esse projeto, como pudemos vivenciar no caso brasileiro. Se a aliança entre o setor financeiro, o grande agronegócio e o setor exportador de commodities estivesse fechada em si mesma e o governo tivesse a feição dessa aliança, a congruência entre o padrão de acumulação e as classes dominantes não seria um segredo. Em geral, os setores dominantes somente vêm a público, expondo sua própria face, em contextos de alguma redistribuição real via o trabalho. Mas o acirramento dos embates sociais de natureza anti-sistêmica que lograram destituir uma dezena de presidentes latino-americanos em cinco anos sugere que o neoliberalismo não tem na inclusão econômica via o trabalho o seu ponto forte, ao contrário. Essa dezena de presidentes foi destituída pelos efeitos perversos do neoliberalismo. Então, como manter as suas bases sem que a feição neoliberal incendeie as lutas sociais? A Terceira Via e a nova esquerda ensinaram muito sobre isso. Mas podemos buscar uma melhor explicação mais longe no tempo, com Marx (Bonapartismo) e com Gramsci (transformismo).

Em O 18 Brumário, Marx mostrava como os camponeses pobres atribuíram a Luís Bonaparte a aura de seu célebre tio, Napoleão Bonaparte, cujo governo havia feito a reforma agrária na França. Em um contexto de crise dos setores dominantes, Luís Bonaparte, personagem menor da política francesa, foi alçado à condição de redentor dos camponeses e do lúmpem. Os camponeses, a maior parcela da população francesa, contribuíram decisivamente para os seus quase 90% dos votos. Contudo, a aliança real de Luís Bonaparte era com a grande burguesia, em especial com o setor rentista. Assim, com o passar dos anos, um enorme número de camponeses perdeu suas terras. Quando os camponeses tomaram empréstimos não tiveram outras garantias senão suas próprias terras. Com os elevados juros, veio a inadimplência e logo as terras camponesas passaram ao controle dos grandes proprietários e dos bancos. Entretanto, poucos camponeses se deram conta desse ardil. A atualidade do Bonapartismo (soft) no tempo presente foi sustentada, entre outros, por Losurdo (2004) em Democracia ou Bonapartismo.

Gramsci analisou uma situação aparentemente paradoxal em que frações subalternas passaram a operar uma política hegemônica que, até então, era por elas concebidas como nefastas e que, portanto, deixaram de ser combatidas:

Aliás, pode-se dizer que toda a vida estatal italiana, a partir de 1848, é caracterizada pelo transformismo, ou seja, pela elaboração de uma classe dirigente cada vez mais ampla (...) com a absorção gradual mas contínua, e obtida com métodos de variada eficácia, dos elementos ativos surgidos dos grupos aliados e mesmo dos adversários e que pareciam irreconciliavelmente inimigos. Neste sentido, a direção política se tornou um aspecto da função de domínio, uma vez que a absorção das elites dos grupos inimigos leva à decapitação destes e a sua aniquilação por um período frequentemente muito longo. (CHIAROMONTE, 2007)

Algo muito semelhante acontece hoje em diversos países latino-americanos. Com efeito, lideranças provenientes de forças antagonistas ao neoliberalismo chegaram ao governo e, em nome dos pobres, dos camponeses e dos trabalhadores, implementam a política das frações locais da burguesia que lucram ao inserir o país de modo capitalista dependente na economia-mundo. Obviamente esse processo não poderia ter sido encaminhado sem forte ação ideológica que de alguma forma difundiu nas massas a crença de que de fato “não há alternativa”. Mas a questão da ideologia não pode ser vista como algo desvinculado do padrão de acumulação. O transformismo é hoje uma condição para a manutenção do padrão de acumulação por despossessão vigente, para utilizar uma expressão difundida por Harvey (2004).

Compreender essas transformações é crucial para compreender os protagonistas das lutas sociais de hoje e o lugar da educação popular em suas estratégias.

Atualmente, a América Latina é um vasto território aberto a empresas que se valem do baixo custo da mão-de-obra, do baixo custo da energia para as corporações, bem como da exploração predatória do meio ambiente – como no caso das fábricas de celulose que, se não forem bloqueadas, irão secar a reserva aquífera da Bacia do Guarani –, ou dos programas de produção de energia a partir da cana de açúcar ou de biodiesel, a partir de vegetais diversos, tudo em benefício exclusivo das corporações.

O agronegócio que redesenha o mapa econômico do país, no qual a exploração é iniciada a partir do Paraguai e chega à Bolívia, passando pela região Sul, Centro-Oeste e Norte (por Rondônia), somente é lucrativo graças a imensas isenções fiscais (Lei Kandir), a generosas linhas de crédito só muito parcialmente pagas e a pesados investimentos em infra-estrutura realizados com verbas públicas, por meio das chamadas PPP e do Programa de Aceleração do Crescimento. Como sabemos, o retorno desse padrão de exploração realimenta o moinho infernal da dívida pública. Como lembrou Tom Zé, indispensável poeta, é o PIB que faz a PIB: a prostituição infantil brasileira. Não é casual que o trabalho infantil tenha voltado a crescer no país, rivalizando apenas com o Haiti.

As políticas de alívio à pobreza sustentadas pelo Banco Mundial como a única possibilidade de política social (leia-se, de governabilidade) para a periferia do capitalismo – outrora criticada como uma opção pela barbárie, pois mantêm os seres humanos miseráveis como sobrantes que somente não sucumbem biologicamente pela fome pois recebem uma magra bolsa (e sem ela retornariam a fome) –, são tidas como exemplo de governança progressista e opção pelo social, inclusive por muitos que vieram da esquerda.

Nesse contexto, as ideias transformadoras são concebidas como anacrônicas: a universidade (e os movimentos sociais) não deve pensar em políticas para acabar com a pobreza e a indigência, por meio de um novo sistema econômico em que o trabalho seja uma dimensão humanizadora. A meta dos neoliberais é que as universidades produzam conhecimento capaz de melhor aferir quem de fato é miserável para que não haja burla na concessão de bolsas. O sonho de muitos tecnocratas do IPEA, órgão de planejamento do governo Federal, é elaborar uma metodologia tão refinada que seja capaz de identificar aquela dezena de indivíduos em Guaribas que, por possuir uma renda familiar de R$ 20 acima da linha de miséria, estava recebendo “indevidamente” a bolsa-família!

O transformismo da maior parte da esquerda coloca os socialistas (anticapitalistas) diante de um áspero desafio: o de reverter a vitória do capitalismo dependente e de sua correspondente barbárie, expresso na naturalização da ideologia neoliberal. Caso a concepção de mundo neoliberal siga sendo vitoriosa, o debate não ultrapassará o ajuste do foco na política de alívio a pobreza, a altura dos muros que separarão os bantustões de pobreza nas periferias das grandes cidades do “país civilizado, branco e feliz”, tal como na África do Sul do apartheid.

Por que essas considerações são importantes para a questão da educação popular? Além do fato de que uma educação para todo o povo, emancipatória, omnilateral e centrada no trabalho que humaniza, somente pode ser realizada em uma “sociedade para além do capital”, como salientou Mészaros (2005),é preciso agregar outras proposições:

1. Esse padrão de acumulação, por requerer a exploração intensiva da natureza, faz emergir lutas de setores que o pensamento evolucionista vulgar supunha residuais, como os dos camponeses, dos povos originários, dos trabalhadores informais e precarizados etc., segmentos que veem seu modo de vida destroçado pelas corporações que se apropriam dos recursos;

2. A questão da territorialidade tem uma importância destacada para esses protagonistas;

3. As periferias, lugares em que habitam os trabalhadores mais “precarizados” e de que se valem facções criminosas para estabelecer domínio de áreas estratégicas para o tráfico e outras formas de ação criminosas, tornam-se cada vez mais semelhantes aos bantustões;

4. As políticas públicas são duramente restringidas e resinificadas; e, finalmente,

5. Em decorrência das lutas, novas formas de organização se afirmam, como as Assembleias Populares, entre outras, conforme visto recentemente em Oaxaca (Assembleia Popular dos Povos de Oaxaca), no México.

Os movimentos que se consolidam a partir dessas contradições têm na formação política e na educação popular um eixo central. Não foi por outro motivo que no Brasil o primeiro germe da universidade popular foi edificado pelo MST: a Escola Nacional Florestan Fernandes (Leher, 2005)!
Essa constatação não passou despercebida a Perry Anderson (2003).

Conforme este autor, para que existam movimentos massivos que se insubordinem à barbárie neoliberal é preciso empreender a “batalha das idéias”: é preciso produzir idéias que orientem e possibilitem a ação política para promover a ruptura com o neoliberalismo.

Mas que idéias são de fato antineoliberais e anticapitalistas nos dias de hoje? De que teoria dispomos? Talvez uma pergunta mais desafiadora seja: como produzir conhecimento com os protagonistas das lutas para que possamos consolidar um pensamento que expresse a hegemonia dos subalternos? Esta pergunta requer uma nova episteme (Leher e Setúbal, 2005).

Produzir conhecimento contra a ordem social vigente, uma ordem que foi capaz de produzir um pensamento tão robusto que logrou acolher grande parte de seus antigos críticos, como a CUT e o PT, é algo dificílimo, pois não é fácil romper com as ideologias dominantes. Hugo Zemelman (2001) sustenta a necessidade das ciências sociais recusar a neutralidade ética frente aos efeitos do capitalismo selvagem. A situação social dos camponeses – cuja própria possibilidade de existência é negada pelo agronegócio e pelos grandes projetos de infra-estrutura que abrem as entranhas do país aos interesses das corporações – e, também, a problemática da juventude das periferias – hoje oprimida pelo desemprego, pela precarização do trabalho e pela violência –, requerem uma opção ético-política classista: “Sabemos construir um problema?” “Sabemos colocar frente à realidade uma agenda realmente distinta das agendas das burocracias nacionais e internacionais, ou das agências de financiamento?” “De onde surgem os temas que preocupam atualmente as ciências sociais?”.

Recusando um conhecimento não comprometido com as lutas sociais, tendência denunciada há três décadas por Perry Anderson (2004) em Considerações sobre o marxismo ocidental, os movimentos e os setores classistas na universidade precisam forjar um espaço de produção de conhecimento de novo tipo.

Essa perspectiva crítica já firmou uma tradição que tem entre seus expoentes autores como Karl Marx, Vladimir Lênin, Rosa Luxemburgo, Antonio Gramsci, José Martí, José Carlos Mariátegui, Aníbal Quijano e, felizmente, muitos outros. Como já foi adiantado, para produzir conhecimento novo, a teoria não será construída a partir de um ponto zero (a tradição crítica é reivindicada) e tampouco está pronta. A teoria igualmente não pode ser produzida em ambientes assépticos, alheios às lutas de classes e ao calor das batalhas sociais. O conhecimento emancipatório tem de ser a práxis emancipatória e libertária, conforme ensinou Paulo Freire e, mais recentemente, protagonistas como os povos indígenas e camponeses Zapatistas (no México), o CONAIE (no Equador) e os camponeses do MST (no Brasil).

Desafios

A reflexão de Gramsci de que aqueles que desejam transformações devem construir uma nova hegemonia, mesmo sem serem dominantes, é vivamente atual. Isso significa negar o economicismo característico dos esquemas analíticos patrocinado pelo diamat “base / superestrutura”, que vê no desenvolvimento das forças produtivas (e, em síntese, na tecnologia) o motor essencial que opera as contradições fundamentais da sociedade: o desenvolvimento econômico, por si só, não forja a sociedade do futuro. São as lutas de classes que fazem mover a história. Como salientou E. P. Thompson (1997), é preciso ampliar a frente cultural, enquanto movimento, política e organização, atividades básicas para fazer avançar a hegemonia dos subalternos.
   
O marxismo sustentou, distintamente do liberalismo, que a luta pela nova humanidade é necessariamente a luta por uma sociedade nova, socialista, mas a criação desta sociedade não é independente do pensamento e da atividade dos homens.

A história dos movimentos sociais e revolucionários demonstra que a educação e a cultura sempre foram um ponto central de seus programas e, como as lutas latino-americanas recentes têm propugnado, a educação é uma prática social crucial para o resgate classista dos trabalhadores. O marxismo sustentou, distintamente do liberalismo, que a luta pela nova humanidade é necessariamente a luta por uma sociedade nova, socialista, mas a criação desta sociedade não é independente do pensamento e da atividade dos homens. A educação, nesse sentido, não pode ser uma tarefa para a geração futura vivente no socialismo.

Um dos aspectos mais novos na atual conjuntura é o questionamento do caráter eurocêntrico e acrítico do conhecimento, em especial pelos povos originários. É preciso recusar a tese de que a ciência e a tecnologia, em si mesmas, dependem apenas do uso que se faz delas. A crítica incide justamente na recusa de seus pressupostos e categorias centrais. O problema do padrão fordista, por exemplo, não é apenas que ele esteja a serviço da extração direta da mais-valia, mas porque esse modelo pressupõe a divisão entre trabalho intelectual e manual, o uso intensivo de energia e dos recursos naturais, o consumismo etc.

O trabalho político de formação requer obrigatoriamente uma pedagogia libertária que seja, ao mesmo tempo, uma autopedagogia capaz de unir teoria e prática e de levar adiante a reforma intelectual e moral em diálogo com a classe que vive do próprio trabalho. Em suma, a transformação cultural deve minar as trincheiras e casamatas em que se abrigam os dominantes e o Estado. E esse processo somente pode pulsar nas lutas do povo.

Raúl Zibechi (2003) caracteriza as principais tendências dos movimentos sociais que emergiram do cataclisma neoliberal que transtorna a América Latina desde os anos 1980. Em sua ótica, os movimentos assumem feição distinta tanto do velho sindicalismo, como dos movimentos europeus, sendo um amálgama de linhagens como “os movimentos eclesiais de base, a insurgência indígena portadora de uma cosmovisão distinta da ocidental e o guevarismo inspirador da militância revolucionária”. Foram esses movimentos que derrubaram presidentes no Equador, na Bolívia e na Argentina, por exemplo, e empreenderam amplos movimentos que impediram o avanço da privatização em diversos países.

Um exemplo de como esses movimentos situam o conhecimento como dimensão profunda de suas lutas pode ser visto no importante encontro dos povos indígenas realizado na Bolívia (2006a). Já na Carta Convite a questão estava claramente exposta:
El evento incluye un encuentro de guías espirituales y sabios indígenas, quienes reflexionaran sobre la agenda indígena continental para orientar, desde la espiritualidad y sabiduría heredada de nuestro mayores, el plan de acción que aspiramos definir entre todos. En este sentido, solicitamos incluir en la delegación de su organización a un sabio indígena o guía espiritual.

É possível constatar que a convocação de “sábios indígenas” produziu encaminhamentos, como se depreende do comunicado final do referido encontro que em sua Declaração da Paz (2006b) enfatiza:

Los Estados nacionales deben reconocer que es la existencia de nuestros pueblos, lo que ha permitido la preservación de la biodiversidad y los conocimientos asociados a ella; por lo que deben garantizar la existencia de nuestros pueblos proporcionándoles recursos para su manejo autónomo y no establecer mecanismos que promuevan la privatización de nuestros recursos naturales, conocimientos tradicionales y espirituales.

Esse aspecto, como indicado anteriormente, resgata e amplia a questão da hegemonia colocada por Gramsci. Muitos desses movimentos, como o MST – que interage com cerca de 1,5 mil escolas em seus assentamentos e acampamentos –, estão tomando em suas mãos a educação e a formação de seus dirigentes, com critérios pedagógicos próprios. No Equador, os povos indígenas criaram a Universidade Intercultural dos Povos e Nacionalidades Indígenas, que dialoga com as quase 3 mil escolas dirigidas por índios.
Nas periferias das grandes metrópoles têm surgido diversas organizações reunindo a juventude de caráter (algo difuso) classista: são cursinhos comunitários, organizações de hip hop, de mulheres, de meio ambiente, partidos, entre outras, que têm colocado o problema da formação como central para as suas organizações.

A consideração de todas essas iniciativas comprova que os próprios movimentos têm situado o problema da educação socialista no cerne de suas perspectivas estratégicas. De nada adiantaria se essa educação fosse dogmática e falsamente universal. Assim, os movimentos estariam reproduzindo a educação utilitarista e particularista própria do capitalismo. O universalismo requer uma educação política no sentido de politeia em Aristóteles e Platão: a comunidade civil dos homens no estado (Adler, 1980:211) e, por isso tem de superar a divisão da sociedade em classes antagônicas que opõem o homo sapiens ao homo faber. Assim, essa educação tem como princípio educativo fundamental o trabalho criador e está dirigida a toda humanidade. O seu propósito é formar crianças e jovens verdadeiramente livres, capazes de protagonizar o porvir histórico dos povos.

O lugar conferido à “batalha das idéias” pelos movimentos que protagonizam a luta contra o capitalismo e, portanto, enfrentam o neoliberalismo buscando desconstruir os seus fundamentos – verdadeiros esquemas mentais profundamente arraigados nas pessoas – confirmam que está em curso um processo em que o conhecimento é política e estratégia. Para tanto, são indispensáveis os diálogos de novo tipo entre a universidade e os movimentos sociais que incitem uma nova práxis e estabeleçam uma nova episteme que enfrente a crítica:

1) à colonialidade do poder, isto é, à idéia de raça como fundamento do padrão universal de classificação social básica e de dominação social;

2) ao capitalismo como padrão universal de exploração social;

3) à supressão do público no debate sobre o futuro do Estado;

4) ao eurocentrismo como forma hegemônica de controle da subjetividade / intersubjetividade, em particular no modo de produzir conhecimento, e

5) à perda de autonomia dos movimentos frente ao Estado, aos partidos e aos credos religiosos, condição para empreender luta ampla e articulada em favor da desmercantilização da economia e dos direitos humanos fundamentais (educação, saúde, energia, terra e da própria natureza).

Nessa perspectiva, em termos de horizonte estratégico, trata-se de produzir conhecimento de novo tipo para que a ação política para desmercantilizar a economia e a cultura da vida possa se sobrepor ao processo de coisificação dos seres humanos. Urge bloquear o avanço das políticas de liberalização e, nesse sentido, será preciso organizar os movimentos contra os Tratados de Livre Comércio, seja no âmbito do ALCA, dos acordos da OMC, seja, ainda, nos contratos estabelecidos pelos Estados nacionais que na prática efetivam o livre comércio.

Uma autopedagogia libertária terá muito a aprender com os movimentos que estão empreendendo transformações sociais estruturais por meio de uma radical reorganização de atos, de palavras e de símbolos – movimentos que levaram o sistema a se desestabilizar por formas inesperadas e criativas. Se estivermos procurando um ponto para a reinvenção das ideias da esquerda, seja em forças nacionais, seja em movimentos internacionais, como o FSM, é preciso produzir conhecimento de outra forma. Vale escutar o que nos dizem os Zapatistas: “perguntando, caminhamos; caminhamos a passos mais lentos, porque vamos mais longe, e mandamos, obedecendo”.
http://uni-vos.com/educacao2.html
Por Sergio Weber, Professor Estadual.

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