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quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

Para Cpers, pacote não beneficia servidores

A presidente do Cpers/Sindicato, Rejane de Oliveira, entende que o conjunto de projetos de lei do Palácio Piratini que propõe a meritocracia é uma maneira de o governo do Estado "se retirar do papel de garantidor da Educação no Rio Grande do Sul". Ela aponta, ainda, que o Executivo desconsiderou a categoria na negociação das medidas. "Só ficamos conhecendo a íntegra quando os textos foram enviados à Assembleia Legislativa. Não houve nenhum debate", reclama.

O Cpers avalia que, ao propor o pacote, o Piratini conseguiu unir o magistério à Brigada Militar (BM). "Pela primeira vez, professores e brigadianos, as maiores categorias do Estado, estão juntos. Muitas vezes a Brigada foi utilizada pelo governo para intimidar e tratar com violência os professores. Hoje está comprovado que todos estão sendo atacados", avalia Rejane, nesta entrevista ao Jornal do Comércio.

Hoje, as categorias farão mais um protesto contra as medidas do governo. E o magistério tem assembleia, às 13h30min, no Gigantinho, para analisar a possibilidade de greve. "Os servidores não ficarão calados", garante Rejane.

Jornal do Comércio - Como o Cpers avalia o pacote do governo?

Rejane de Oliveira - Estas medidas foram apresentadas como um pacote de bondades. Mas elas têm o objetivo de jogar para os servidores a responsabilidade sobre os problemas do serviço prestado pelo Estado. Além disso, os projetos de meritocracia significam o fim da isonomia salarial e a paridade.

JC - De que forma isso poderá acontecer?

Rejane - A meritocracia se estabelece por uma premiação, o 14º salário. Mas, a isonomia garante que todos os trabalhadores que exercem a mesma função devam ganhar o mesmo salário. Na meritocracia, alguns terão salários diferentes. Aqueles que correspondem aos critérios ganham o x, os outros, x a menos. Terão o mesmo cargo, mas não o mesmo salário, acabando com a isonomia. Também acaba com a paridade, pois o mérito se baseia no desempenho. Como o professor aposentado irá avaliar o seu desempenho? A paridade estabelece que os trabalhadores tenham os mesmos reajustes. Os aposentados ficarão com salários congelados para sempre, pois o governo defende que a única forma de progressão seja através do mérito.

JC - Não haverá como mudar de nível no novo sistema?

Rejane - Não, a única forma será através do mérito e do 14º salário. Não temos mais as vantagens que constam no nosso plano, que com o tempo acabará extinto. E, o que é pior: o 14º, na compreensão do governo, poderá ser pago ano sim, dois, três anos não, já que não é incorporado à vida funcional. Ele é pontual, o que significa que o futuro como aposentado é terrível. Acaba o direto agora e o efeito para o futuro é muito pior, bloqueando avanços salariais, sucateando nossas conquistas.

JC - O secretário estadual de Educação, Ervino Deon, argumenta que as medidas ajustam a lei estadual à federal.

Rejane - O que tem na federal é o piso nacional, em que, a partir de 2010, os planos de carreira estaduais precisam ter o valor base salarial de R$ 950,00 - hoje R$ 1.137,00 reajustado. Atualmente, o básico no Rio Grande do Sul é de R$ 320,00. Bastava o governo mandar um projeto para a Assembleia estabelecendo o valor nacional. Só isso. Mas o Executivo não quer e entrou com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade contra o valor nacional, demonstrando que não irá cumprir a determinação. Tanto que quer estabelecer que a progressão só aconteça via meritocracia.

JC - E o vencimento de R$ 1.500,00, não é considerado um avanço pelo sindicato?

Rejane - É um teto com caráter completivo. O projeto não fala em reajuste ou vencimento básico. Se tenho 20h, terei um salário teto de R$ 750,00. Se forem 40h, R$ 1.500,00. Se pegar os R$ 320,00 de básico, o completivo que já é recebido atualmente para se chegar ao piso regional de R$ 430,00, os triênios, difícil acesso e demais elementos que compõem os salários, pouquíssimos precisarão de completivo para chegar a R$ 750,00 ou a R$ 1.500,00. A mudança no salário será pequena, com um prejuízo enorme no futuro. Pelo projeto do governo, quem hoje ganha R$ 600,00, para se chegar aos R$ 750,00 terá R$ 150,00 de acréscimo. Até parece uma boa notícia. Só que, daqui para frente, o completivo não permitirá que qualquer reajuste futuro mude a realidade do contracheque dos trabalhadores que forem hoje beneficiados.

JC - O governo sustenta que 32 mil matrículas terão o completivo.

Rejane - É bem menos, e os valores são pequenos. Hoje, dos 120 mil servidores da Educação, uns 90 mil ficam fora do pacote. Entre os aposentandos, são raros os que ganham menos de R$ 750,00, pois tiveram movimentos na sua vida funcional. Logo, não receberão nada. Isso sem falar dos funcionários de escola que nem são citados. Além disso, acaba com o plano de carreira, pois não há modificações para o vencimento básico. Penaliza os que mais investiram, que são os de nível 5 e 6. São os que têm graduação e pós-graduação e que no Rio Grande do Sul são 85% dos servidores do magistério, que foram em busca de qualificação em um plano de carreira em que ela (a qualificação) é favorecida e há incentivo para que fiquem na escola pública através de benefícios como os triênios.

JC - E a substituição da licença-prêmio por licença qualificação?

Rejane - É mais um grave ataque. A licença-prêmio é uma valorização do tempo de serviço e, por consequência, da experiência dos trabalhadores. É um período para o professor se reequilibar. Numa sala de aula são 42, 50 alunos que, não raro, têm na escola a única refeição do dia. É com esta realidade que muitos convivem. Veja o grande número de trabalhadores com síndrome do pânico, depressão.

JC - Há benefício na concessão de matriz salarial de 15% sobre o resultado financeiro positivo?

Rejane - Aí está o grande golpe. O projeto diz que o trabalhador será contemplado conforme o aumento da receita e diminuição de despesas. O governo quer que os servidores achem interessante diminuir o número de servidores se for para diminuir despesas. Ficará interessante fechar escolas, pois se reduz despesas aumentando a chance de se ganhar os 15%. É uma tentativa clara de construir um movimento para que o governo se desobrigue cada vez mais do seu papel. O governo usará a meritocracia para identificar algumas escolas como "de qualidade", apontando outras que não são. Os pais vão migrar seus filhos para as de excelência, justificando o fechamento das outras. Ai terá que se decidir o que fazer com os trabalhadores. A questão do desempenho tanto em Minas Gerais como em São Paulo, anunciados como modelos para o projeto gaúcho, estabelece que com duas avaliações insuficientes seguidas ou três alternadas se pode demitir o servidor.

JC - O Cpers entende que o objetivo é diminuir a oferta na educação pública?

Rejane - Este é o projeto de fundo do governo. Algumas escolas serão privilegiadas e já estão sendo escolhidas através de parcerias com a iniciativa privada. Haverá uma redução drástica de escolas e, em consequência, também no número de servidores. A meritocraica busca mecanismos para exonerar trabalhadores. Junto com o completivo, as mudanças no estatuto do servidor deixam claro que o objetivo do governo é se retirar do papel de garantidor da Educação.

JC - O sindicato conhece detalhes da avaliação por mérito?

Rejane - Baseia-se em prêmio que, é para alguns, o que indica uma concepção equivocada sobre a educação ao admitir que pode se escolher quem terá educação de qualidade. Minas Gerais e São Paulo, que aplicam a meritocria, têm baixa qualidade na educação. Além disso, têm índices altíssimos de evasão e violência nas escolas. Isso porque a meritrocarica pressupõe uma disputa: qual é o professor que garante a qualidade, qual é o aluno que não atinge o bom desempenho, qual é a escola com melhores índices? Educação não se constrói com disputa, mas com humanização. Além disso, inverte valores. Uma escola pública de periferia, por exemplo, poderá ser rotulada pelo mal-desempenho de seus alunos, sendo a que mais precisa de apoio para elevar a autoestima, a fim de que os alunos sejam respeitados e resgatados.

JC - Estão claros os critérios de avaliação das metas?

Rejane - Não tem nada sobre isso nos projetos. Mas, a ex-secretária (Mariza Abreu) garantiu que seriam adotados os modelos de São Paulo e Minas Gerais, o que é gravíssimo. Como se avalia o desempenho de um aluno que estuda dentro de um container, ou em turmas com mais de 50 crianças, ou numa escola com multisseriação (três séries numa mesma sala de aula)? Isso, sem falar na falta de material pedagógico, acervos nas bibliotecas. A meritocracia joga para os professores a responsabilidade que é do Estado em proporcionar uma educação de qualidade para todos.

JC - O secretário Deon alega que o Cpers não quis conversar com o governo.

Rejane - No tempo da secretária Mariza, fomos chamados para uma reunião da Agenda 2020. Dissemos que não iríamos participar de um debate com empresários sobre o tema da educação que, a nosso ver, deveria ser discutido entre Estado e categoria. Depois, com o novo secretário, tivemos uma audiência, em que entregamos reivindicações pedindo retorno. Sem resposta, o secretário acabou marcando uma nova audiência, mas antes foi anunciado o pacote. Se tínhamos uma audiência, o governo não poderia ter aguardado para nos apresentar o projeto antes de divulgá-lo? No dia da audiência, pedimos cópias dos projetos e o secretário alegou que precisava da autorização da Casa Civil para repassá-los. Só ficamos conhecendo os projetos quando chegaram à Assembleia. Não houve oportunidade para o debate.

Gisele Ortolan
Jornal do Comércio - http://jcrs.uol.com.br/site/noticia.php?codn=14471&codp=25&codni=3

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